sexta-feira, setembro 29, 2006

44- POLÍTICA 4

Fui ao ofício religioso de Vladimir Herzog, na Catedral da Sé.

Minha consciência cristã não me permitia conformar-me com sua morte. Logo no primeiro ano de faculdade havia perdido um colega mais velho, o “Minhoca” (Alexandre Vanuchi), abatido covardemente pela ditadura. Estar presente ao evento era o mínimo e o máximo que eu podia fazer.

Foi uma experiência emocionante. A praça cercada de militares, a multidão lotando a linda igreja. O sentimento de poder e impotência colidindo e co-existindo no coração. A percepção que algo acontecia, que a realidade mudava e que o mundo (ou pelo menos o Brasil) seria diferente daquele dia em diante. Difícil explicar.

quarta-feira, setembro 27, 2006

43 - POLÍTICA 3

O grupo de estudos políticos do qual fiz parte nos anos de universidade chamou a atenção de um homem que pretendia fundar um novo partido: PHC – Partido Humanista Cristão. Os ventos da abertura já sopravam.

Fiz amizade com ele, que nos tempos mais sombrios da ditadura havia sido preso - e trazia uma labirintite crônica como souvenir -, e participei de muitas atividades visando a organização partidária. Mas chegamos à conclusão que éramos poucos para implantar um partido e o melhor seria fazer parte de um partido já existente como “grupo”, “ala”, “facção”.

À procura de um partido nos levou a ter uma reunião com o Dr. Olavo Setúbal, líder do PP e renomado banqueiro. A reunião foi no escritório de um dos mais importantes membros daquele partido, o advogado Cláudio Lembo (enquanto escrevo, ele ocupa o cargo de governador de SP). Reunião curta, cheia de gentilezas, mas que nos deu a certeza de que pouco ou nenhum espaço de ação teríamos caso aderíssemos. Com o tempo, o grupo enfraqueceu-se e dispersou. Nosso líder e amigo chegou a candidatar-se (creio que a deputado) pelo PDT e cheguei a alistar-me como membro deste partido. Mas nunca atuei partidariamente, apesar de ter sido membro do staff de dois governos municipais em minha cidade.

domingo, setembro 24, 2006

42- POLÍTICA 2

Há vários anos, em parte devido à repressão militar, não havia greves no campus da USP. De repente, eclode uma greve na ECA (Escola de Comunicações e Artes), onde estudava uma amiga, participante de nosso grupo local de ABU. Ela apresentou a situação para o grupo, pois achava que devia apoiar a greve, pois os motivos eram justos, mas não queria desafiar as autoridades, que proibiam greves.

A discussão sobre o assunto foi profunda, havia pessoas nas três posições: contra, a favor, e sem opinião. Nossos estudos e debates nos levaram a apoiá-la, caso aderisse à greve. Fomos criticados por aqueles que achavam que a postura do grupo não era muito “cristã”, e admirados por aqueles que esperavam que cristãos fossem omissos e submissos nas questões políticas.

A greve finalmente acabou, sem a vitória dos estudantes. Mas serviu, e muito para meu amadurecimento. Anos mais tarde, um dos membros do grupo, que mais se opunha a uma postura politicamente ativa do grupo, veio me dizer que reconhecia que estávamos certos.

terça-feira, setembro 12, 2006

41- POLÍTICA 1

Ser um ativista político universitário nos anos 70 não era coisa simples. A trilha entre a “esquerda revolucionária e perseguida”, e o “conformismo burguês ao status quo” era estreita e mal demarcada. Além disso, o ativismo cristão era criticado pelos dois lados: por negar Marx e suas ilusões; e por pregar a rebeldia ao autoritarismo instalado. Ética e justiça eram base para atitudes que desagradavam aos dois lados. Mesmo assim, passamos incólumes.

Eu fazia parte de um grupo em SP que se reunia mensalmente para discutir “cristianismo e política”. Certa vez convidamos para a reunião um conhecido vereador, pastor evangélico, que havia sido eleito pela oposição e depois bandeara-se para a situação. Colocamos o homem em cheque e a cena foi constrangedora, ele não tinha justificativas para o que fizera, a não ser “conveniência política”. Resultado: escrevemos uma carta repudiando a sua atitude de mudar de partido sem consultar seus eleitores, traindo, assim, a confiança deles. Sem dó...

terça-feira, setembro 05, 2006

40- ROUBADO!!!

É difícil imaginar sensação pior do que a de ter sido roubado. Mesmo com o alívio de não ter se encontrado frente a frente com o bandido, livrando-se assim de uma possível agressão física e até a morte, a sensação de violência e invasão de privacidade é das piores possíveis. E eu já tive esse sentimento mais de uma vez...

Uma delas foi quando adolescente. Morava em Sampa, numa casa térrea, confortável, mas nada “chic”. Viajamos por alguns dias e ao voltarmos haviam invadido a casa, arrombando a janela. Além do furto, mexeram na cozinha, espalharam comida pela mesa e chão da sala, uma sujeira intencional e maldosa. Moleque ainda, passei alguns dias a imaginar os terríveis e variados sofrimentos a que submeteria os ladrões, quando os pegasse...

Muitos anos depois já em Sorocaba, casado e com filhos, saí do trabalho, perto das 5 horas da tarde, peguei meus filhos na escolinha e levei-os pra casa. A empregada havia saído por volta das 4, portanto a casa ficou fechada por pouco mais de uma hora. Entramos em casa, pela sala, e havia algo estranho. Em segundos percebemos que o vídeo cassete não estava junto à TV, e, olhando pelo corredor, vimos aberta a porta da cozinha, que dava para o quintal. Era uma porta de ferro e vidro, que havia sido entortada, provavelmente com pé-de-cabra, para a invasão. Num canto do quintal, muito, muito assustada, estava nossa cadela preta, viva, mas com certeza agredida, tal era o terror nos seus olhos. Voltei para o interior da casa e subi para os quartos, agora já temendo encontrar alguém. No quarto, sobre a cama, a gaveta de objetos da minha esposa estava toda revirada, faltando as poucas peças de jóia que tínhamos, algumas de grande valor sentimental. Mas não havia ninguém mais.

Chamamos a polícia, que veio, fez o B. O. e nos advertiu para o fato de que algumas residências naquele bairro haviam sido furtadas recentemente. Nunca recuperamos o que nos foi tirado. Eventualmente compramos o que podia ser comprado, menos os objetos de estimação. Apesar de nada de mal ter-nos acontecido, foi impossível impedir, por muitos dias, uma profunda sensação de agressão, impotência, raiva e medo.